18 de setembro de 2009

A sobra do amor

Foi na ação de descascar uma laranja, em meio a círculos cítricos carregados de sensualidade; foi na ação cortante de desnudar uma laranja, que pensou no amor abortado, não uma, nem duas, mas várias vezes e pôde ver, perceber, sentir... o toque de sua alma que paira no ar.
'Amor tem alma?'Perguntou. 'O amor é toda alma' Respondeu.
E agora, perante essa constatação, o que fazer com a alma de um amor abortado pairando no ar, pesado como um ponto-vírgula, insolente como um sinal vermelho e interrompido como a morte?
O que fazer quando o amor não se esgotou e sobra ainda em alma arrastada cobrando vida até a última gota?
'Alma de amor não é coisa com a qual se brinque'. Pensou, enquanto chupava a tampinha da laranja, aquela parte de cima que a gente corta, fere e chupa tentando evitar que o líquido ácido te escorra da boca até o queixo e isso te faz rir.
Alma de amor assusta mesmo, te ameaça. Ela causa um certo desespero perante a impotência do 'nada há a se fazer'. Essa impotência é uma necrose. Ela vem quando não há chance de ressucitação do amor e qualquer respiração boca a boca tende a assassiná-lo de vez.
Amor morto de morte matada é assim mesmo. Morre magoado, sem saber porque morreu. É criança ainda, morre anjo e vai pros braços do diabo, deixando uma saudade desgastada e uma ânsia de correr pra trás, bem pra trás.
Chupou todo o bagaço, com uma fome da qual não sacia e decidiu seguir em frente, ignorando qualquer alma que rondasse. Resolveu chupar outra laranja, dessa vez uma menos ácida porque os amores, espera, podem sempre ser doces.

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